Generaliz-o-as-a-amos-ais-am
É comum generalizarmos ao criar ou transmitir conhecimento. Procuramos sempre formular um modelo que explique toda ou boa parte da realidade em questão e faça-a previsível, conforme nossos objetivos. O modelo atômico que vemos no ensino médio, por exemplo, é uma abstração da realidade que exclui muitos aspectos desnecessários (como o desdobramento de cada um dos componentes do átomo) para a compreensão exigida de um estudante de ensino médio. Ainda temos, nas aulas de literatura, períodos históricos estanques (arcadismo, romantismo, realismo, naturalismo etc.) que apesar de ajudarem a compreender a arte não passam de meras visões macro-generalizadoras (e por vezes grosseiras) do fenômeno em si. Quantas vezes não nos deparamos com poemas ou romances completamente alheios à estética nas quais se encontram inseridos segundo a academia? E isso não é necessariamente ruim. Tudo depende dos objetivos pelos quais se faz a generalização. O ensino de gramática, por sua vez, é sempre feito a partir dela. Afinal, um estudante comum não precisa saber desenvolver uma árvore de sintagmas para produzir um texto satisfatoriamente inteligível - é possível fazê-lo a partir de regras que generalizam e categorizam os componentes da língua.
Enfim, a mais ou menos medida, generalizamos.
As generalizações não acontecem somente na escola. Na vida diária, utilizamos diversos conceitos gerais que excluem pormenores da realidade. Exemplo disto são os termos para orientação sexual. Todo mundo sabe que é difícil encontrar uma pessoa que se defina cem por cento homossexual ou heterossexual. Da mesma forma que uma pessoa bissexual não gosta obrigatoriamente da mesma maneira dos dois gêneros/sexos como sugere a definição de bissexualidade. A sexualidade humana é fluída e complexa - e mesmo assim fazemos uso de labels, de generalizações, para ela.
Enfim, a mais ou menos medida, generalizamos também na vida diária.
Tomemos como exemplo o estereótipo do brasileiro como morador de um país predominantemente selvático e como falante nativo do espanhol. As pessoas que reproduzem tal estereótipo têm um conhecimento limitado no que diz respeito à América Latina, pois pensam que a língua espanhola é comum a todo continente. Elas também levam a presença da Amazônia no norte do país em conta para formular o estereótipo, preenchendo o resto do território brasileiro com matas - aí, novamente, está a marca do conhecimento que não é nulo, mas limitado e desinteressado, convencido de que o pouco é suficiente, acerca de algo. Uma investigação atenta ao povo e às vegetações do país revelaria que falamos português e que a nossa vegetação é muito mais diversa do que se pensava. Tal investigação, por outro lado, geraria modelos simples que não corresponderiam totalmente à realidade brasileira: a palavra "português brasileiro" abarcaria variantes linguísticas completamente distintas, como o português carioca e o português gaúcho; assim como a diversidade descrita pelos botânicos seria mais complexa do que as categorias "mata atlântica", "cerrado", "caatinga" e assim por diante.
Em resumo, o que quero dizer com este texto é que 1) generalizamos para produzir e reproduzir conhecimento e isso não é necessariamente ruim, 2) usamos generalizações todos os dias e 3) generalizar é diferente de estereotipar.
Perceber isso me deu novos olhares ao ensino e à escolarização. Escrevo sobre esses olhares qualquer outro dia...
Sobre o Autor
Gosta de línguas, reflexões introspectivas, UTAU/Vocaloid, discussões sobre gênero e sexualidade, do céu e de fazer da vida alheia um bordado de renda (de chita filó).
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