maisoutrascoisas

a primeira coisa que me aconteceu foi assim: em 2014 eu queria ser diferente com 17 anos. e já era bem bovary o meu caso. só que com mangás. fim da adolescência, ainda alguns ódios, vontades de se escapar, de se perder no mundo, diriam meus professores do ensino médio, queria chamar a atenção, diria meu padrasto. e eu gostava de cultura japonesa, otaku, japanoide. tinha uma deixa pelo oriente. esse lugar exótico seria o meu escapismo. e comecei a estudar mandarim. era o que tinha. a china se aprochegando com soft power e eu querendo desejar fugas de porto alegre. instituto confúcio, 17 anos, estudando pro vestibular da ufrgs. estudando mandarim estudando mandarim. ok, agora eu já estudo mandarim - mas como chamar mais atenção? escutando música chinesa. sim. me destacar, me destacar e fugir. até aí tudo bem, eu só queria ser inalcançável. mas acontece que música pop chinesa não me descia e su sabia pelos meus ódios que não ia durar. alguém seria igual a mim eventualmente. foi daí que rolou música chinesa independente que ninguém ouve. foi isso. encontrei nos confins da internet uma mulher chamada 曹方. tem postagem sobre ela aqui no blog. não tinha como ninguém conhecer ela além de mim. pronto. agora sim eu só tinha eu mesmo. que excêntrico, mas era eu. ouvindo 曹方, estudando pro vestibular e estudando mandarim com as letras da 曹方. que são lindas, por sinal. a minha preferida eu inclusive traduzi neste tumblr. eu estudei mais pelas letras dela do que pelas aulas confucianescas. entrei na ufrgs. ouvindo sempre as músicas e tal e rolês e mandarim e estudantes intercambistas, praticando mandarim e praticando mandarim. praticando mandarim era exotismo e exôdo. eu me acabo num lugar dentro de um outro lugar que é um lugar muito pequeno. assim eu fui na sinolíngua. e pensava: que absurdo, que loucura. eu quero mesmo é outro lance. queria dar um rolê longe só porque eu sinto esse mal do século ainda, essa angst atrasada, essa nostalgia que é só fuga, fuga, romantismo. a moral é que eu gostava da 曹方 porque eu sabia que era impossível e é só na impossibilidade que eu me sentia. e daí me inscrevi, contraditoriamente, pra bolsa de estudos do instituto confúcio. duas tentativas. em 2017 não deu certo. falha. o não. eu já esperava ele porque eu já vim desse lugar de impossibilidades. pobre também. ser pobre te ajuda a ser romântico. só que agora eu já escapei. desejei as fugas e fugi. acabei chinoide. chamando a atenção do governo chinês. eu sou a bovary que foi pra paris e teve um casamento no castelo, virou rainha, voltou no tempo e achou o seu espaço, transcendeu. eu não me suicidei da maneira mais escrota na cama. e agora tô em pequim conversando com fãs da 曹方. esperando quando vai ser o próximo show dela. nem quero ser diferente porque eu já sou. ela lançou um álbum novo. tenho que ouvir. os fãs dela são gays e eu também. nada surpreendente. ninguém conhece ela por aqui também. mas agora eu vou ver ela ao vivo. leia seus mangás a sério. 
a segunda coisa que me aconteceu foi assim: em 2015 eu queria cantar na competição de mandarim do instituto confúcio. ponte chinesa, o nome. cantei. só que antes de cantar eu comprei bolinhos de lua. uns taiwaneses vendem na feirinha do bom fim. mas só no fim de setembro, que é quando acontece o festival de outono na china. eles são dos festivais eles. tem quatro festivais. enfim. eu queria cantar na competição de mandarim que acontece no festival de outono. comprei bolinhos de lua - taiwaneses - conversei com eles. sotaque diferente. os meus professores são pequineses. bolinho pra cá, bolinho pra lá. além de cantar, tinha um quiz da competição chinesa. a minha pergunta foi sobre o bolinho. muito engraçado eu estar com um bolinho de lua no bolso recém comprado nervoso respondendo a pergunta sobre ele. 月饼。 mas não é sobre isso ainda: é sobre o filho dos taiwaneses feirantes. eles têm um filho, jovem. que ajudava eles na feirinha. que eu continuei frequentando só pra poder treinar meu mandarim. até que eu viesse à china, né. eu vim. eu tinha que vir em algum voo. mas agora faz três anos que eu comprei aquele bolinho e é de novo festival de meio de outono. ontem comprei alguns bolinhos em pequim. a funcionária do mercado me disse que eles acabam todos na véspera do feriado. e encontrei no voo de vinda pra cá, há cerca de 20 dias, o filho dos taiwaneses. desculpa. essa coisa não vale tanto a pena, mas é que ele tinha que voltar pra taipei no mesmo dia em que eu vinha pra pequim? talvez ano que vem, nessa mesma época, eu cante de novo na competição de mandarim. ponte chinesa. eu não sei o nome desse filho deles, e acho ele bonitinho.

tem mais uma coisa mas já tô exausto.

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Sobre o Autor

Gosta de línguas, reflexões introspectivas, UTAU/Vocaloid, discussões sobre gênero e sexualidade, do céu e de fazer da vida alheia um bordado de renda (de chita filó).

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